Você já reparou que, hoje, antes de escolher para onde viajar, a maioria das pessoas consulta redes sociais? O destino não é mais apenas o ponto no mapa: é o que aparece no Instagram, no TikTok, no YouTube, nos grupos de WhatsApp. Isso vale tanto para uma cidade histórica famosa quanto para uma pequena vila com apenas uma pousada charmosa.
E aqui está o ponto: destinos de pequeno e médio porte, que muitas vezes têm orçamentos reduzidos para marketing, podem ganhar enorme visibilidade se souberem construir uma comunidade digital. Mais do que postar isoladamente, o segredo está em trabalhar em rede, de forma colaborativa.
Neste artigo, vamos mergulhar em como redes sociais podem aproximar empresários, comunidade e turistas, transformando cada like, comentário e compartilhamento em valor real para o destino.
O que é uma comunidade digital no turismo
Uma comunidade digital é, em essência, um espaço virtual onde diferentes atores – moradores, negócios locais, turistas, instituições – interagem em torno de um propósito comum: valorizar e promover um destino.
Não é um grupo no WhatsApp criado apenas para “falar de turismo”. É uma rede viva, que conecta quem produz (pousadas, restaurantes, guias), quem consome (visitantes e moradores) e quem organiza (prefeituras, associações, governança).
Quando essa comunidade se forma, os esforços deixam de ser isolados: o restaurante marca a pousada, o guia compartilha o post do artesão, o turista posta fotos com a hashtag coletiva do destino.
Por que os pequenos destinos precisam disso?
Destinos menores, muitas vezes fora do eixo das grandes capitais, enfrentam três desafios comuns:
- Baixo orçamento de marketing. A prefeitura tem recursos limitados, e os empresários trabalham no improviso.
- Mensagens desencontradas. Cada negócio comunica uma promessa diferente – “sossego”, “aventura”, “gastronomia”, “religiosidade” – e o turista não entende qual é a essência do lugar.
- Concorrência com destinos maiores. Cidades vizinhas, com mais estrutura ou mídia, acabam atraindo visitantes que poderiam se encantar com os pequenos atrativos.
É aqui que a comunidade digital faz diferença: ao alinhar vozes e multiplicar o alcance, mesmo destinos modestos conseguem disputar espaço na mente (e no feed) dos viajantes.
Cases nacionais que mostram o poder das redes
📍 Tiradentes (MG) – o charme coletivo que ganhou força no Instagram
Tiradentes, uma cidade histórica mineira de 7 mil habitantes, conseguiu transformar sua estética colonial em combustível digital. Pousadas, restaurantes e até carrinhos de churros usam hashtags coletivas (#TiradentesMG, #TiradentesHistórica). O turista, ao postar, encontra milhares de registros semelhantes, criando uma percepção de comunidade forte e ativa.
Resultado: a cidade recebe mais de 300 mil turistas por ano, segundo o Observatório do Turismo de Minas Gerais, sendo boa parte atraída pelo encantamento digital antes mesmo da visita.
📍 São Thomé das Letras (MG) – da lenda ao feed
São Thomé, com pouco mais de 6 mil habitantes, soube usar seu imaginário místico para alimentar o marketing digital. Guias locais, artesãos e moradores compartilham lendas, trilhas e cachoeiras em comunidades digitais. O TikTok foi um catalisador: vídeos de turistas viralizam mostrando paisagens “extraterrestres”, atraindo jovens curiosos.
📍 Pomerode (SC) – turismo colaborativo em datas temáticas
Conhecida como “cidade mais alemã do Brasil”, Pomerode transformou eventos como a Osterfest (festa de Páscoa) em campanhas coletivas. Restaurantes, hotéis e moradores alinham comunicação: todos publicam, no mesmo período, com identidade visual unificada. Resultado? A cidade já recebeu mais de 250 mil visitantes em apenas um evento sazonal, segundo a Santur (Santa Catarina Turismo).
Como redes sociais aproximam atores do turismo
- Hashtags coletivas – Criar uma “palavra de união” para o destino. Exemplos: #VivaCaconde, #DescubraPrata, #ExperiênciaMantiqueira.
- Campanhas conjuntas – No feriado de Corpus Christi, por exemplo, todos os negócios podem usar a mesma arte e mensagem: “Passe o feriado em [nome da cidade]”.
- Marcação cruzada – Uma pousada indica um restaurante, que marca um guia, que divulga o artesão. O turista entende que o destino é integrado.
- Conteúdo gerado pelo usuário (UGC) – Incentivar visitantes a postar com hashtags do destino e republicar esses conteúdos nos perfis oficiais.
- Grupos de alinhamento – Não apenas divulgar, mas também organizar. Criar grupos no WhatsApp/Telegram para empresários e comunidade alinharem temas de postagens.
Benefícios reais da comunidade digital
- Alcance ampliado: cada post individual vira parte de um mosaico coletivo.
- Menos custo de mídia paga: quando todos divulgam juntos, o alcance orgânico cresce.
- Prova social: o turista confia mais no destino ao ver vários relatos espontâneos.
- Fidelização: o visitante se sente parte da comunidade e tende a voltar.
- Fortalecimento da identidade: a cidade passa a ser reconhecida por uma promessa clara (aventura, gastronomia, cultura, bem-estar).
Pontos de atenção e riscos
- Mensagens desencontradas: se cada ator usar uma linguagem diferente, o turista recebe informações confusas.
- Excesso de autopromoção: se cada negócio só “fala de si”, o coletivo não ganha força.
- Falta de liderança: sem uma coordenação, a comunidade pode se dispersar.
- Críticas públicas: redes sociais também amplificam reclamações; é preciso preparar os atores para lidar com isso de forma positiva.
Oportunidades para pequenos negócios
- Restaurantes podem criar cardápios temáticos alinhados a eventos da cidade.
- Pousadas podem oferecer descontos para quem usar a hashtag oficial.
- Guias locais podem fazer “lives” mostrando atrativos, marcando outros negócios.
- Produtores rurais/artesãos podem ganhar vitrine ao serem incluídos em roteiros digitais.
Tudo isso gera pertencimento: o turista percebe que não está consumindo apenas um serviço, mas uma experiência coletiva.
Gestão coletiva em turismo
Nenhuma comunidade digital se sustenta apenas com iniciativas isoladas. É fundamental ter coordenação para alinhar as vozes, evitar ruídos e potencializar esforços.
Esse papel pode ser desempenhado por diferentes atores:
- Prefeituras ou secretarias de turismo – funcionam como catalisadoras, oferecendo suporte institucional.
- Associações locais (comerciais, de produtores, de guias) – ajudam a organizar agendas conjuntas e alinhar os interesses de diferentes setores.
- Empresários líderes – muitas vezes, pessoas visionárias puxam a rede de forma espontânea e inspiram os demais.
- Governança Turística – quando existente, torna-se peça-chave: articula setores público e privado, promove alinhamento estratégico, incentiva campanhas coletivas e garante que o digital reflita a identidade do destino.
Quando há uma Governança Turística ativa, ela pode ser a “cola” que conecta os pontos: da estratégia de redes sociais à experiência real do visitante.
Da tela à vivência: o impacto na jornada do turista
A comunidade digital é apenas o começo. O verdadeiro valor acontece quando o que é prometido no Instagram acontece na vida real:
- O turista vê uma foto de trilha → chega e encontra sinalização adequada.
- O visitante reserva um jantar indicado no feed → é bem atendido e compartilha a experiência.
- O hóspede marca o hotel → o hotel interage e cria vínculo pós-viagem.
Esse alinhamento entre online e offline transforma visitantes em embaixadores do destino.
Como começar: guia prático em 5 passos
- Defina uma hashtag coletiva. Simples, memorável e exclusiva.
- Crie um grupo de alinhamento. Empresários, comunidade e prefeitura precisam falar juntos.
- Estabeleça calendário de postagens. Eventos, feriados e atrativos precisam estar sincronizados.
- Estimule o turista a participar. Incentive fotos, vídeos e depoimentos.
- Monitore resultados. Alcance, interações e número de postagens com a hashtag são indicadores-chave.
O turismo é colaborativo e digital
As redes sociais deixaram de ser vitrine individual para se tornarem praças digitais, onde destinos podem crescer juntos. Quando pousadas, bares, guias e moradores entendem que não são concorrentes, mas parte de um mesmo ecossistema, a cidade se fortalece.
O turista não compra apenas um produto. Ele compra a história coletiva que a comunidade digital conta.
Fontes
- Ministério do Turismo – www.gov.br/turismo
- Observatório do Turismo de Minas Gerais – observatorioturismo.mg.gov.br
- Santur – Agência de Desenvolvimento do Turismo de SC – www.santur.sc.gov.br
- Sebrae – Turismo em pequenos negócios – sebrae.com.br
- Rede Brasileira de Observatórios de Turismo – rbotur.org.br